Sábado, Julho 20, 2024

VENDEDORAS NA VILA DE VIANA IGNORAM RISCO DE ATROPELAMENTO E INSISTEM NA VENDA DESORDENADA.

Tão logo a viatura da Polícia se retirou, as vendedoras voltaram a expor os seus produtos no chão, sem se importar com os agentes que fazem a ronda no local.

Por: apostolado
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De repente, parou um carro da polícia, três agentes saltam da viatura em simultâneo. As comerciantes dispersaram-se, em fuga, do tipo “salve-se quem puder”. Naquela situação de aflição, uma vendora tentou atravessar a avenida, debaixo da pedonal amarela (ponte amarela), na vila de Viana. Foi por um triz. O motorista de uma Land Rover branca pisou o freio do veículo a tempo, o ruído produzido pelos pneus e o asfalto despertou a atenção dos transeuntes e das pessoas dentro dos estabelecimentos comerciais ao lado, que saíram para saber o que tinha acontecido.

Este é o cenário de todos os dias na vila sede do município de Viana, desde o início do programa de Reordenamento do Comércio, implementado há dois meses pelo Governo Provincial de Luanda, com o objectivo de acabar definitivamente com a venda desordenada e garantir uma boa imagem à capital.

A actividade dos agentes da Polícia e da Fiscalização não tem sido fácil. Quanto às vendedoras, parece que já se acostumaram com a situação de corridas. Pois, quando os agentes aparecem, elas se dispersam, criando um ambiente de confusão e susto para quem estava distraída, atravessam as estradas sem se importarem com o perigo de atropelamento. Umas são apanhadas, colocadas na viatura com o seu negócio e levadas para a esquadra.

Depois que os agentes se retiram, elas voltam ao mesmo lugar, fazem mercados, estreitam a faixa de rodagem, as viaturas fazem manobras para não pisarem as mercadorias, ocupam também as calçadas, obrigando os peões a circularem noutros lugares.

O Jornal de Angola constatou, no local, duas zungueiras não resistiram à perseguição dos agentes. Deixaram cair o negócio e elas próprias foram ao chão. Foram apanhadas, uma delas em estado de gestação, feriu-se ligeiramente no joelho da perna direita, e forçadas a subir na viatura patrulha com os seus pertences. De seguida a viatura arrancou.

Tão logo a viatura da Polícia se retirou, as vendedoras voltaram a expor os seus produtos no chão, sem se importar com os agentes que fazem a ronda no local.

O destino dado aos bens apreendidos

Uma fonte da Administração Municipal de Viana, que pediu anonimato, informou que, em alguns casos as senhoras ficam detidas por algumas horas e depois são soltas, noutros casos, se houve alguma resistência, ofensas morais ou física contra os agentes em serviço, podem ser levadas a tribunal para responder em processo sumário.

 

Quanto aos bens, explicou a fonte, são armazenados num lugar seguro e posteriormente levados a um lar de acolhimento de crianças ou idosos, como forma de penalizá-las e inibir para não continuarem com essa prática.

O negócio é mais lucrativo na rua  

Violante António, 43 anos, vendedora de rua, contou ao Jornal de Angola que vende naquelas condições porque é mais lucrativo do que ficar no interior do mercado.

Sobre os riscos de ser detida e perder os bens ou mesmo ser atropelada durante a fuga, Violante António respondeu que já anda habituada com isso pois, disse, já foi detida algumas vezes e como consequência perdeu o negócio, mas não desistiu.

“Nos mercados, nós que estamos a entrar agora nos põem lá no fundo, onde não tem clientes. Para conseguir um bom lugar tem que pagar 30 mil kwanzas aos fiscais. Onde vamos encontrar esse dinheiro?”, questionou.

Violante António contou, ainda, que a estratégia usada para não caírem na falência nas operações da polícia é não expor todo negócio. “A maioria do negócio fica na casa de processo, aqui só trazemos um pouco, quando acaba, vamos buscar outro”, disse.   

Teresa Manuel, outra vendedora, justifica que a permanência na Vila, na rua, deve-se ao facto de não haver lugar nos mercados e que para a obtenção de espaço o preço vai além das suas capacidades financeiras.

Mais de 57 mil bancadas desocupadas nos mercados

Contrariando as alegações das vendedoras de rua, a porta-voz do Programa de Reordenamento do Comércio, Nádia Neto, garantiu que, em Luanda, existem perto de 200 mercados espalhados por todos municípios e mais de 57 mil bancadas desocupadas.

O município de Viana, por exemplo, disse, tem 23 mercados e 6.473 bancadas. O que significa que há lugares suficientes para albergar a maioria das pessoas que fazem a venda nas ruas da cidade.

Nádia Neto acrescentou que o programa de Reordenamento do Comércio “não é um combate à venda ambulante”, até porque, disse, “o comércio ambulatório é uma actividade legal”. “Só não se pode é fazer mercados nas ruas”, sublinhou.

Teimosia das vendedoras

Os agentes da Polícia e da Fiscalização, na vila de Viana, incansavelmente vão fazendo o seu trabalho, mas o facto é que tem sido difícil lidar com a situação, devido à teimosia das vendoras.

Um dos agentes de plantão, debaixo da pedonal, mais conhecida como “ponte amarela”, visivelmente cansado, acha que se as medidas fossem mais duras, muitas já teriam desistido dessa prática. “Tinham que ficar pelo menos seis meses na cadeia, só com uma refeição por dia. Quando saíssem, duvido que continuariam aqui”, disse.

Falta de urinóis

Ficar por alguns minutos em determinados pontos da vila de Viana, como debaixo da ponte amarela, na rua por trás do supermercado Candando, nos arredores da Casa da Juventude, no passeio da estação dos comboios, é preciso ter fôlego para suportar o cheiro de urina. A falta de urinóis naquela zona força os utentes a urinarem em tudo quanto é canto.

Dona Juliana, 69 anos, aposentada, moradora da vila de Viana há mais 40 anos, disse que se cansou de tanto repreender as pessoas que insistem em fazer a descarga na sua parede e não sabe como vai resolver isso, visto que a circunscrição não tem balneários públicos. “Meu filho, nós aqui já estamos cansadas de falar. Perdemos as forças, não sabemos mais o que fazer”, lamentou.

Outro problema tem a ver com a questão do lixo produzido pelas vendedoras.

Dona Juliana, que foi funcionária da fábrica de tecido “Textang”, em Luanda, apoiada numa bengala, conta como era a vila de Viana antes. “Aqui na vila, meu filho, não era qualquer pessoa que circulava. Isto era bonito e havia regras, as ruas eram limpas”, recordou.

Com o olhar no passado, descreveu a sua juventude e os lugares onde as pessoas da sua época gostavam de estar. “A escola onde estudamos, ali na actual Repartição Municipal da Educação, o jardim da vila que ficava perto do palácio, o Cine Kilumba, onde assisti os filmes ‘A Marca da Maldade’, ‘O Sétimo selo’, ‘O Batedor de Carteiras’ e outros que já esqueci. Hoje o cine está transformado num balneário imundo”, lamentou. 

A ancião lamentou ainda o facto de a maior parte das residências e lugares históricos estarem transformados em estabelecimentos comerciais, as ditas cantinas, cabrités, bares, lojas de telefones, gráficas, casas de processo, o que, na sua opinião, tira a estética daquilo que era a vila de Viana.

São Paulo com novo rosto

Margarida de Lemos, 35 anos, casada, é moradora do bairro São Paulo há vários anos. Entusiasmada com a presença da equipa do Jornal de Angola, disse que já consegue passear debaixo do seu prédio, desde que começou o Programa de Reordenamento do Comércio.

“Eu não conseguia ficar em baixo do prédio devido à venda desordenada. Actualmente já fico debaixo do prédio com o meu marido e filhos a apanhar um pouco de frescura, o que antes era impossível”, sublinhou. 

A satisfação de Margarida é partilhada por quase todos os moradores e visitantes do São Paulo, que dão nota positiva à iniciativa do Governo Províncial de Luanda, por ter conseguido inserir, de facto, os comerciantes dentro dos mercados.

O São Paulo de hoje, pelo que se pode constatar, regista um ambiente de calma e já se pode transitar pelo passeio sem correr o risco de pisar no negócio de uma vendedora.

Para além disso, verifica-se também, um cenário de limpeza em toda rua Ngola Kiluanje, lancis e separadores pintados, iluminação pública reposta e o pavimento com a devida marcação, para garantir uma melhor circulação de veículos e peões.

Zonas prioritárias

O Programa de Reordenamento do Comércio, de acordo ainda com a porta-voz, Nádia Neto, está focado, rigorosamente, na zona do São Paulo, estendendo-se até às ruas Ngola Kiluanje, Rei Mandume, Cónego Manuel das Neves e Gajageiras.

 

Depois de estar consolidado nessas áreas, acrescentou, vai se atacar com o mesmo rigor as outras áreas da cidade de Luanda, tais como Congolenses, vila de Viana, Calemba 2, Benfica e outros.

A também administradora do Distrito Urbano do Rangel apelou a todos que insistem na prática da venda desordenada a entrarem nos mercados, sob pena de sentirem depois o peso da lei.

Origens da vila de Viana

O nome Viana pertenceu a um velho português, funcionário da estação de comboios, que tinha como actividade fazer a mudança de linha das locomotivas, vulgarmente chamado de agulheiro, que se chamava António Viana e fixou residência no local de trabalho por muitos anos. 

Consta que a vila de Viana recebeu os seus primeiros moradores na década de 1920, depois dos colonizadores fixarem os seus cómodos, durante as viagens.

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