Num mar de nomes que compõem a extensa lista dos condecorados pelos 50 anos da nossa independência, o número 516 poderia facilmente passar despercebido. Mas por trás dele está o MovAngola, um movimento cuja dimensão solidária rompe o silêncio das estatísticas e grita pela dignidade social em tempos onde o individualismo parece regra. A inclusão do MovAngola nesta lista não é apenas simbólica — é um grito de reconhecimento a um coletivo que representa a verdadeira essência de serviço à pátria.
Enquanto muitos nomes são celebrados por feitos em gabinetes e tribunas, o MovAngola fez-se presente nos bairros, nas comunidades esquecidas, onde o Estado falha e a esperança muitas vezes escasseia. Levaram cestas básicas onde havia fome, ergueram palavras de conforto onde habitava o desespero, e construíram pontes sociais onde antes só havia muros de indiferença. Falar da sua condecoração é falar da valorização de um ativismo que não busca holofotes, mas resultados.
É, portanto, de justiça histórica essa distinção. Não pela posição em que foram colocados — ainda que 516 seja numericamente modesto —, mas pelo que representam em termos de ação concreta. O MovAngola é a resposta viva ao cinismo daqueles que dizem que “em Angola nada muda”. Muda, sim. Porque há jovens, cidadãos e voluntários que não se contentam com o discurso, mas que fazem da solidariedade uma prática diária.
Infelizmente, vivemos numa época em que o mérito muitas vezes se mede por conexões políticas e não por impacto social. E é exatamente por isso que a condecoração do MovAngola precisa ser mais do que uma formalidade institucional: precisa ser um símbolo de mudança de paradigma. É tempo de reconhecer, com mais seriedade e prioridade, aqueles que constroem Angola não a partir do privilégio, mas a partir do chão da realidade.
O gesto do Estado ao incluir este movimento é louvável, mas não pode ser isolado nem apenas comemorativo. É necessário que sirva como ponto de partida para o fortalecimento de políticas de apoio à sociedade civil organizada, ao voluntariado e aos projetos de intervenção comunitária. Não se constrói uma nação apenas com infraestrutura — constrói-se, sobretudo, com valores, justiça social e ação cidadã.
A condecoração do MovAngola é, sem dúvida, merecida. Mas não é apenas um prémio: é um lembrete. Um lembrete de que Angola precisa mais do espírito solidário e menos de vaidades institucionais. Precisa mais de ação coletiva e menos de promessas vazias. Precisa, sobretudo, de reconhecer com prioridade os que, longe dos palácios, decidem amar e servir esta pátria com as próprias mãos.
Jornalista Siona Júnior